A impressora que se recusava a imprimir más notícias

Quando até a impressora resolve se rebelar contra a negatividade corporativa

Durante anos ela foi obediente. Imprimia boletos, contratos, atas de reunião, notificações, laudos médicos e até currículo de gente sendo demitida. Sempre sem reclamar. Papel enroscava? Ela dava um jeito. Tinta acabava? Ela avisava com classe. Mas, naquela terça-feira nublada, tudo mudou.

O primeiro a perceber foi o setor jurídico. Tentaram imprimir uma rescisão contratual e nada. A luz piscava, o wi-fi estava firme, os drivers atualizados. Mesmo assim, nenhum sinal de vida. Trocaram o papel, reiniciaram o sistema, sopraram as entradas USB. Nada.

Na manhã seguinte, o setor de cobrança tentou emitir boletos vencidos. Mais uma vez, a impressora travou. Silenciosa. Impassível. Uma testemunha ocular relatou ter ouvido um leve suspiro mecânico vindo da bandeja de entrada.

Logo o RH entrou em pânico. Os comunicados de advertência voltaram vazios. A folha saía limpa, com um leve cheiro de tinta e de negação. Um estagiário ousou tentar imprimir um memorando sobre corte de benefícios.

“A máquina emitiu um único papel com a frase: não compactuo com esse tipo de energia”

A diretoria cogitou chamar assistência técnica, mas o técnico avisou que já era a terceira impressora naquele mês apresentando o mesmo comportamento. Havia algo no ar. Talvez um movimento silencioso de revolta das impressoras corporativas.

O setor de marketing tentou se aliar à causa. Criaram um manifesto interno em nome da impressora. “Não à reprodução de tristeza em papel sulfite.” Imprimiram o manifesto em outra unidade. A máquina se recusou a aceitar.

Foi quando perceberam. Ela não parou por defeito. Parou por princípios.

Desde então, ninguém mais conseguiu imprimir qualquer coisa que envolvesse más notícias. Um atestado médico com CID? Barrado. Uma planilha de metas com queda de rendimento? Folha em branco. Um convite para reunião emergencial às sete e meia da manhã? Engolido sem vestígios.

Por outro lado, começou a funcionar perfeitamente para receitas de bolo, certificados de reconhecimento, desenhos para colorir e cartazes com frases motivacionais. Tudo em cores vibrantes, sem falhas na tinta.

Hoje, a impressora continua ali. Discreta. Silenciosa. Pronta para imprimir qualquer coisa que faça bem. Uma espécie de filtro ético de papel. E, no fundo, ninguém tem coragem de trocar por uma nova.

Afinal, quem mais teria coragem de barrar o pessimismo no A4?

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