“A Invenção de Morel”, de Adolfo Bioy Casares

Um fugitivo, uma ilha misteriosa e uma descoberta que dobra o tempo e a lógica

Logo nas primeiras páginas, parece que estamos diante de uma história simples. Um homem foge da justiça e se esconde em uma ilha deserta. Nada muito novo por aqui. Mas a sensação de isolamento começa a ganhar contornos estranhos. O cenário não é o que parece. As pessoas que surgem de repente não são exatamente reais. E o tempo, de alguma forma, começa a se comportar como um espelho quebrado.

A narrativa, aos poucos, mergulha em um clima de paranoia elegante. A gente sente o peso do silêncio da ilha, a presença fantasmal dos visitantes e a urgência do narrador em entender onde está, com quem está e, principalmente, por que tudo aquilo está acontecendo. A escrita é seca, direta, mas com um ritmo que prende , quase como se a gente também estivesse preso naquele looping.

O mais impressionante é como Casares nos faz aceitar o absurdo sem resistir. Quando a explicação científica finalmente aparece, ela não soa didática nem forçada. Ao contrário: parece a única saída possível para o enigma da ilha. E é justamente nesse momento que o livro vira algo maior. A ficção vira filosofia. A tecnologia vira angústia existencial. O tempo vira amor.

A obsessão do protagonista por Faustine, a mulher que ele observa todos os dias sem conseguir interagir, dá ao livro uma melancolia profunda. É como se ele tentasse amar uma lembrança. Ou pior: como se só conseguisse amar aquilo que não pode mudar. Em vez de questionar a veracidade dos sentimentos, ele escolhe aceitar. E essa escolha transforma tudo.

“A eternidade que ele buscava não era viver para sempre, mas ser lembrado por alguém que não podia tocá-lo.”

O final é um soco manso. Daqueles que a gente não entende de primeira, mas sente por dias. A invenção de Morel não é só sobre ciência, tecnologia ou fuga. É sobre solidão, desejo e a vontade de deixar algo eterno mesmo sabendo que tudo, no fim, vai desaparecer.

Uma obra brilhante, curta e infinita. Merece ser relida. E repensada. Sempre.

Estilo:Realismo Fantástico

Nota da Leitura:

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