“Morte e Vida Severina”, de João Cabral de Melo Neto

Uma poesia dura sobre o Brasil que insiste em sangrar

Tem livro que atravessa. Morte e Vida Severina não é só um clássico da literatura brasileira. É um grito seco, quase sussurrado, que ecoa até hoje. João Cabral de Melo Neto escreveu um poema dramático que parece não envelhecer nunca. A história do retirante Severino é, infelizmente, a história de muitos brasileiros. E mesmo que você saiba disso, o livro ainda consegue te atingir com força.

É tudo muito simples e, ao mesmo tempo, muito profundo. A narrativa acompanha o Severino, que deixa o sertão para tentar sobreviver no litoral. Mas a cada parada, ele só encontra mais morte. Mais miséria. Mais desesperança. E o mais chocante é perceber que esse ciclo, escrito em 1955, continua acontecendo nas bordas de qualquer cidade grande.

"Quando o nascimento é um milagre e a morte, um alívio"

Uma das coisas que mais me impactou foi como o livro trata a morte. Não como exceção, mas como regra. A morte, ali, é cotidiana. Está no rio, na estrada, na espera. Não é a morte espetaculosa de tragédias épicas. É a morte miúda de quem nasce com o destino já meio traçado. E isso dói.

“Severino” não é só o nome do personagem. É um tipo social. Um símbolo. E quando o autor escreve que a morte dele seria “uma morte severina”, ele está dizendo que é só mais uma. Que não vai comover ninguém. Que já era esperada. E isso é de cortar.

Sobre viver apesar de tudo

Mas o livro não termina só na tragédia. Há um lampejo. Uma fagulha. A cena do nascimento no fim é o que dá sentido ao título inteiro. Morte e Vida. Porque mesmo em meio a tudo, a vida insiste. A criança que nasce no final é o que segura o leitor pela gola e diz: “ainda tem algo aqui”. E isso emociona.

 

Essa virada me pegou. Porque, mesmo depois de tanto sofrimento, o texto não entrega o cinismo. Ele entrega poesia. Ele entrega esperança. E isso, vindo de uma obra tão crua, é quase revolucionário.

É uma verdadeira aula de poesia social. João Cabral não escreve com floreios. Não tem sentimentalismo. Mas tem precisão. E tem verdade. A linguagem é seca, a métrica é firme, e o ritmo lembra um lamento nordestino. Tudo isso amarra a dor com beleza. É como se ele dissesse: “olha essa tragédia aqui, mas olha de frente”.

Não tem como sair ileso. Morte e Vida Severina é daqueles livros que fazem você parar por um tempo depois que termina. E não por ter um final arrebatador, mas porque é impossível ignorar a potência da denúncia que ele carrega. É poesia, mas também é documento.

 

Estilo: Clássicos

Nota da Leitura:

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