O cara que colecionava pedidos de desculpa

Quando o perdão não vem, mas o arquivo sim

Ele não era de perdoar. Mas sabia guardar.

Cada “foi mal”, cada “desculpa aí”, cada “não era a minha intenção”. Não por ressentimento, mas por estilo. Começou anotando tudo num caderno. Depois passou pra planilhas. E, por fim, criou uma nuvem criptografada com categorias como “desculpas furadas”, “arrependimentos de verdade” e “aquela vez no aniversário de 2011”.

Quando alguém vacilava, ele não brigava. Só pedia: “me manda por escrito, beleza?”. Tinha até um e-mail só pra isso: me_perdoa@arrependimentos.org.

Com o tempo, virou conhecido. Era quase um cartório emocional. Tinha desculpas de todos os tipos: de amigos, de ex, de colegas de trabalho e até da atendente da farmácia que uma vez o confundiu com outro cliente e o chamou de “seu Antônio”.

"Dizia que não precisava do perdão, só da documentação."

Era como um museu das coisas que deram errado.

A galera achava curioso.

Alguns até começaram a mandar desculpas espontaneamente só pra garantir a licença emocional. Uma vez, recebeu uma mensagem:

“Desculpa se um dia eu te magoar, mesmo sem querer. Já deixo registrado.”

A coleção só aumentava.

Imprimiu algumas, emoldurou outras.

Transformou uma em almofada.

Fez um varal de desculpas no quintal e chamou de instalação artística.

Teve até uma exposição: “Desculpas: 2007–2025”.

Ninguém sabia se era arte, trauma ou só teimosia.

Ele não explicou.

Um dia, recebeu uma desculpa que não reconheceu.

Era de alguém que ele já não lembrava mais.

Leu em silêncio.

Sentiu um nó na garganta.

Guardou na pasta “Desculpas que vieram tarde”.

Depois disso, deu um basta.

Desligou o e-mail.

Fechou as pastas.

E queimou tudo numa fogueira lenta, ouvindo Sepultura.

Não esqueceu de nada.

Mas, pela primeira vez, não sentiu a necessidade de guardar.

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