O violino que sonhava em ser rockstar

Quando o violino quis ser hardcore e descobriu que melancolia não combina com distorção

O violino sempre se achou deslocado. Tocava em casamentos, trilhas de filmes clássicos, concertos formais em teatros cheios de gente que tossia baixo para não atrapalhar. Mas no fundo queria mais. Queria distorção, microfone alto, camisa preta e palco iluminado por luz estroboscópica.

Um dia se cansou de sonhar. Se infiltrou numa banda de hardcore do bairro. Apareceu no ensaio, afinado e cheio de atitude, convencido de que podia ser o diferencial.

No primeiro acorde, a guitarra distorcida quase o engoliu. A bateria o atropelava a cada virada. O baixo não deixava espaço para respirar. O violino tentava berrar com suas cordas, mas soava como lamento tímido em meio ao caos.

Mesmo assim insistiu. Se posicionou na frente do palco, tentou um solo no meio da música mais pesada do repertório. O público estranhou. Alguns riram. Outros acharam que era experimental. Um crítico chegou a escrever “interessante tentativa de incluir violino em contextos improváveis”, mas não explicou se era elogio ou piada.

A banda tentou dar uma chance, mas a sonoridade não batia. O violino queria ser fúria, mas continuava soando como drama. Queria ser soco, mas entregava melancolia. Era um peixe fora d’água tocando cordas em alto volume.

Depois de alguns ensaios frustrados, foi dispensado. Saiu em silêncio, guardado no estojo, mas com dignidade. Sabia que não era feito para o hardcore. Ainda assim, carregava orgulho de ter tentado.

Hoje o violino voltou para os casamentos e concertos, mas com uma cicatriz sonora. Quem presta atenção jura que, no meio de uma valsa, ele insere discretamente três notas de punk. Só para não esquecer que também já foi rockstar.

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